sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Encontros - Episódio 5




              
VOLUNTÁRIO

Quem já sentiu o fim da vida sabe o que significa uma segunda chance.

Eu estava caído quando ele chegou, mal pude ver seu rosto, nada consegui dizer, senti apenas meu corpo deixando o chão; se aquele fosse o fim, seria feliz.

A fome não é a dor maior, o abandono nos mata antes, e quando a morte chega, leva apenas nosso corpo, porque nossa humanidade há muito tempo já nos deixou.

“Fica comigo!” – a voz vinha de longe, mas era carregada de um sentimento que eu não sentia desde que minha mãe partiu, amor.

Puxei o ar com todas as forças que ainda tinha, eu queria ficar, e fiquei.

Aos poucos fui me recuperando.

Ainda lembro do primeiro prato de comida que recebi. Olhei pra aquilo tudo, só pra mim. Comi a metade e devolvi a outra.

“Você não tá com fome?” – foi o que ele me perguntou, parando também de comer.

“Pra quem não tinha nada, ter a metade é muito. Quero que outra pessoa também se alimente.” – foi o que respondi.

Ele chorou.
Eu também.

“Se é o que você deseja, é o que vamos fazer.” – Ele me devolveu o prato, pegou o seu que também estava pela metade e disse: “Vem comigo.”

Não precisamos andar muito para encontrarmos dois irmãos à beira da estrada. Eu conhecia aquele olhar. Nos aproximamos e oferecemos nossas comidas. Os dois sorriram, um sorriso que eu também conhecia. Pegaram os pratos. Um deles ergueu o braço e fez um sinal, duas meninas menores surgiram, e o que eram duas metades, alimentaram quatro, que depois daquela cena foram acolhidos por nós.

Naquele momento eu soube o que faria com minha segunda chance. Acredito que ele também sabia.

Eu me tornaria, em tempo integral, um voluntário.

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